terça-feira, 25 de abril de 2023

OS MENINOS DE AMANHÃ EM GRÂNDOLA VILA MORENA- 25 de Abril sempre! Fascismo nunca mais!

"Grândola vila morena" do Zeca Afonso é inevitávelmente o hino do 25 de Abril, feriado nacional desde 1975 para comemorar a queda do fascismo, do fim da guerra, não se fala muito da queda do Império Português mas ele caiu e isso é o que interessa quer5 fira ou não o saudosismo orgulhoso de muitos compatriotas portugueses).
Estamos no Verão de 1977 rumo ao sul do país até às praias algarvias no tempo em que não havia auto estrada/ rodovia. Paragem obrigatória: Grândola, ainda no Alentejo, região donde os meus avós, mãe e tia ( ambas crianças que estudaram para sair duma condição) vêm para migrar para os subúrbios de Lisboa. Como tantos outros alentejanos e alentejanas em busca de trabalho braçal nos idos anos 40. Sou sobrinha duma morena alentejana que nos lembra os 500 anos da presença dos mouros na terra onde nascemos e crescemos e filha duma branca de neve loura de olhos verdes que nos lembra tanto das invasões francesas, como da presença de povos germânicos muito antes de Portugal ser Portugal, antes de Cristo. A cor do pele, dos olhos e do cabelo não define se somos opressores ou oprimidos e o nosso poder aquisitivo. Muitas vezes somos opressores de nós mesmxs. Nem nos define se somos reacionários ou libertários. O que define se somos reacionários em maior ou menos escala é a dimensão da nossa ignorância acerca de nós e dos outros. Ignorar, desconhecer, é mais que natural. Não nascemos ensinadxs, mas podemos nos informar, esclarecer. Fazer diferente e evitar que estupidezes se repitam. Já ignorar, desprezar o que se acha que conhece e falar e agir com aquela propriedade que coloca a receptora numa dúvida dialética ( estou a ouvir e ver bem? entendi bem? deixa reposicionar o queixo. " Espera aí, por gentileze, pode averiguar se eu estou ali na esquina e depois avise-me").
Eu continuo a ser uma menina de amanhã mesmo que possa parecer uma teimosia e até um capricho. ( Uma vez escutei um macho alpha, por acaso mais novo uns 11 ou 12 anos que eu e que nunca tinha saido do seu subúrbio comentar com a sua turminha de adolescentes tardios: " Libertária kkkk." Enfim... Infantilizar os outros demonstra a sua infantilidade). Como eu, muitxs meninxs andam por aí e eu conheço embora seja um grande desafio a constança da união e solidariedade nestes tempos individualistas. Mas sem esperança que sentido faz?
" os meninos d’amanhã vão acordar num mundo novo
com a estrela da manhã a iluminar o bem do povo
e nos livros da escola ouvirão contar
quantas lutas se travaram p’rá vida mudar
os meninos saberão o amor dos revolucionários
quе lutaram sem descanso p’ra mudar estе fadário
e as memórias vigilantes saberão contar
essas vidas que se deram sem desanimar
há tanta gente virada p’ra trás
gente que vive do menos mal e do tanto faz
mas o amor em que eu estou a pensar
anda remando contra a maré a desinquietar
os meninos d’amanhã verão o corpo dessa ideia
que perturba o rame+rame co’ a revolta que semeia
e ao colo da liberdade ouvirão contar
o pão+pão e o queijo+queijo que te anda a faltar
vão encontrar o tesouro dentro do punho fechado
do discreto combatente que está aí mesmo ao teu lado
e das bocas saciadas ouvirão contar
os porquês insatisfeitos que o fazem lutar"
José Mário Branco- Os meninos de amanhã (elogio do revolucionário) do albúm " A MÃE" (1978)
A Piu
Br, 25 de Abril de 2023

segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

EXISTIR É UMA AUDÁCIA série: aprender a aprender

 


O episódio da ativista e atriz trans Keyla Brasil fez-me refletir e procurar mais informação sobre a causa trans no especifico, como a causa LGBTQ+ no geral. Não é que não acompanhasse. Pelo contrário, existem vários documentários disponiveis onde se pode escutar e testemunhar esses sujeitxs históricxs na primeira pessoa. Aliado ao facto de conhecer várias pessoas de distintos géneros e orientações sexuais por circular no meio artístico, principalmente no teatral. 

O que me chamou mais a atenção foi a Keyla mandar um ator cisgénero sair do palco porque ele era um transfake, desrespeitava o palco - que é sagrado -logo a causa trans ocupando o lugar que estas deveriam estar. Aqui temos uma questão que eu entendo e sou totalmente solidária: as trans como todas as pessoas que não são cisgénero ou que são mas por motivos de cor, raça não existe por ser uma construção social, de classe social ou por serem mulheres, mães, mães solo a sua visibilidade muitas vezes está compromotedida, logo a sua existência. Sim no caso as trans, como toda gente, tem diretito ao acesso à saúde, educação, mercado de trabalho e à integridade física e moral. O que nem sempre é assim... Elas, as trans, devem ter espaço e condições para contar as suas narrativas e serem respeitadas e não terem que recorrer à prostituição que por vezes é o que resta por falta de acesso às oportunidades de trabalho por puro preconceito. No fundo todos nós queremjos ser respeitadxs. O respeito é uma negociação entre direitos e deveres de todas as partes.

Eu, como mulher, artista, mãe solo, cidadã quero ter a liberdade ( e luto por ela) de viver da forma que eu bem entender sem prejudicar xs outrxs e poder entrar em cena com as personagens que eu bem entender com base no estudo, na pesquisa dessas mesmas personagens que podem revelar muita coisa de mim e desconstruir ideias que eu tenha acerca de quem sou eu de que é isto ou aquilo. Porque não eu ir para cena encaranando uma trans que um dia foi um homem que não se sentia bem naquele corpo e encontrou no seu atual corpo a sua verdadeira essencia e liberdade de ser quem é? 

Ser ator ou atriz não será também nos colocarmos no lugar dxs outrxs abrindo horizontes para nos revelarmso para nós mesmxs e para o mundo? Desde que não caricature essas pessoas, reproduzindo estereótipos que as coloca no lugar de distância porque é que eu hei-de ser interrompida e censurada por estar em cena encarnando uma realidade que aparentemente não é a minha? E também sendo solidária à causa trans a partir da minha existência.

É lamentável que a Keyla esteja a sofrer de ameaças de morte, ataques xenofobos e transfóbicos pelo sucedido. Espero que ela encontre uma boa rede de apoio e proteção e que continue com a sua luta por visibilidade sem autoritarismo. Acredito que ela entenda percebendo pelo audio educado e com amorosidade que me enviou, só posso desejar a todxs nós: DITADURA E CENSURA NUNCA MAIS! VIVA A LIBERDADE E ABAIXO O PATRIARCADO, O NEO LIBERLISMOS E A MERITOCRACIA!

Isso é possível? Cada um que faça a sua a parte tomando consciência de quem é, do lugar que ocupa na sociedade e como se relaciona com a força da existência e do trabalho dos demais.

A Piu

Campinas SP 20/01/2023

sábado, 28 de janeiro de 2023

EU FALO E ESCREVO A PARTIR DE MIM série: aprender a aprender


Todxs nós viemos aqui para aprender. Ou não? Alguém nasce ensinado? Ótimo, óptimo, se uns já atingiram um nível de entendimento que a maioria não! Então partIlhem, compartilhem, dividam para somar. Eu tenho uma formação de esquerda, o que é que isso possa significar dentro deste sistema neo liberal como tal classista, em que nuns lugares é mais gritante que noutros. Falo e escrevo a partir do meu lugar, como tal a gerência agradece que não me coloquem em posições que não me pertencem por pura ignorância, lugares comuns, informação distorcida e equivoco. Gratinados.
Esta foto data de 1995, o meu primeiro trabalho como actriz/ atriz profissional. Sim, é um personagem masculino: o criado da peça original de Carlo Goldoni: A Estalajadeira. Por coincidência, se é que esta existe, eu iniciei o meu percurso artistico profisional no Alentejo,sul de Portugal, terra dos meus avós maternos. Porém, iniciei essa prática teatral em Lisboa, capital de Portugal. Primeiro no teatro amador depois num curso de actores. Conheço Lisboa e Portugal como a palma da minha mão, nomeadamente o meio artistico, no caso teatral. Como tal sou trabalhadora das artes cénicas desde 1990 e eu como a restante da classe artistica portuguesa não precisamos de lições de moral diante do desafio que é ser artista nesse país. Quanto muito precisamos de abanões, chacoalhos, como todas as classes artisticas em qualquer parte do mundo.
As minha origens são de trabalhadores braçais e criadagem, no caso os meus avós. Os meus pais já fazem parte duma pequeno burguesia trabalhadora que emerge no final dos anos 60,. Nunca tivemos criadagem nem pretendemos ter. Tampouco exploramos a força de trabalho de alguém como muitos por aí que se dizem de esquerda mas na hora H.... " venha a mim o que é teu".
Eu vivo do meu trabalho, que no caso é artístico, e que tem o seu lugar, a sua importância na sociedade. Há 11 anos que vivo no Brasil e muitas vezes não tenho sido acolhida pela classe artistica local na sua plenitude. Artistas das cénicas bem consolidados e referêncio nacional e também internacional. Os bambambam tão sorridentes e de esquerda ( gourmet) que tem hora que parece que visitamos o templo zen, mais o sambódromo em Orlando. E ainda bemos uma saché com comida japonesa. Sim, é uma provocação. Assumo. No meio disso tudo parece que a nossa experiência e formação não vale quase nada, não a temos, e ainda é esperado bajular com aquele sorriso maravilhoso e3 agradecido no rosto. Vai da estupefacção, ao enjoo. Daí a pessoa sabe que o Brasil
,como o mundo, é grande e vai em busca de outras acolhidas. Tem de tudo. Mas na hora do aperto quem nos enxerga como trabalhador(a)? Muito poucos sim, outros tantos nem tanto.
O episódio da atriz trans Keyla Brasil tem me deixado numa profunda reflexão acerca do lugar que nós ocupamos ou que desejariamos ocupar, nas inúmeras (in)visibilidades. Eu entendo o grito de dor e de pedido de ajuda de pessoas como a Keyla Brasil embora não concorde com a invasão de palco exigindo que um ator saia de cena porque é transfake. E dói confirmar que todxs nós somos vitimas do patriarcado, do neo libealismo. Todavia, por continuarmos vivxs há a esperança de aprendermos a aprender a nos escutarmos e enxergamos uns aos outrxs para viver com o coração mais quente numa grande rede de apoio.
A Piu
Campinas SP 28/01/2023

sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

É P'RA RIR OU É P'RA CHORAR? - série: sorria! você está sendo imaginado!


Por acaso até nem acho piada nenhuma aquela das portuguesas terem bigode, porém trouxe essa piada para mim e este é um dos resultados. Acredito que eu não seja a única, nem tenho essa pretensão. Quanto mais formos a desconstruir esterótipos, escárnios e preconceitos mais ondulante o mundo se torna. Donde vem esse esterótipo? Primeiro: normalmente as mulheres com "bigode" ( penugem farta) são oriundas de contexto rural, independentemente da nacionalidade. Elas são italianas, russas, alemãs, portuguesas, espanholas, etc e etc. Será a alimentação aliada ao facto de em muitos casos não lhes ser permitido cuidarem delas mesmas? Eu conheci casos desses: o marido proibir a esposa de cortar o bigode... E ela, às escondidas, cortar com a faca das couves. É dum risivel constrangedor. As mulheres serem obrigadas a se embrutecer por ordem de terceiros. Mulher é para ficar em casa a cuidar o marido e dos filhos e não precisa de dar nas vistas nem ser objetop de desejo de terceiros. É assim e mais nada!

Para mim a expressão artística serve justamente para desconstruir o que está tão enraizado, nomeadamente a autonomia do nosso corpo e da nossa libido que somente a nós nos diz respeito. O que é viver no patriarcado senão uma série de imposições, distorções do masculino e do feminino onde a conquista de territórios, corpos, força de trabalho são o mote há milhares de anos aliado à competição e ao corpo e desejo objetificado. Precisamos juntes de refletir sobre isso e cada uma, ume, um que se descubra para si mesme, que se desnude das máscaras sociais e dos exibicionismos gratuitos que subscrevem o que já está aí, onde a competição e as comparações de quem é melhor ou pior, bem sucedido ou não, de mais gostosude ou não, com mais seguidores ou não.... Ufa! Que canseira. A mediocridade desvia-nos do essencial que é sermos nós mesmes e buscar xs nossxs parceirxs e desencanar, mesmo que seja dificil, de quem não nos dá a mão e não se solidariza com a nossa existência.

Deixo aqui este manifesto que deixei em comentários, nomeadamente do Jornal de  Noticias e da Keyla Brasil, enviando para a mesma no privado e para o actor André Patricio. Da Keyla recebi um audio educado falando da importância de eu me manifestar diante do ocorrido e desejando tudo de bom, do André recebi um joinha. Pronto, é isso. Para bom entendedor meia palavra basta, porque é recorrente observar quando alguém que lê algo não concorda porque abana com as suas certezas chamar a outra pessoa de confusa, diminui-la digamos. Já me aconteceu isso uma ou outra vez e já estou preparada. Não sou dona da verdade, mas atirar areia para os olhos não vale, muito menos diminuir. Valeu Keyla por responder educadamente, espero que a sua luta continue sem agredir trabalhadores da classe artistica e afins: 

" Há uma questão que está na ordem do dia, principalmente depois da invasão de bolsonaristas ao Planalto Central destruindo várias obras de arte. Esse ato de invasão e destruição, de desrespeito para com artistas e democracia hoje considero ainda mais fascista mesmo que a causa base seja pertinente e urgente ser olhada com ações de inclusão, no caso a LGBTQ+. O André não é um transfake É UM ACTOR. UM TRABALHADOR. Merece respeito. E nós como artistas temos o direito, a liberdade de encarnarmos quem quisermos e sermos tratadxs com respeito, dignidade. Existem trans autoritários e que se acham no direito de interromper um TRABALHO e mandar o ator sair(!!!??). Essa mesma trans talvez se fizesse isso aqui no Brasil, no país dela, sofresse graves riscos de vida. Ela tem o direito de se manifestar e ser incluída mas não desta forma que arrisco em dizer que é bolsonarista e ataca a classe artística que muito provavelmente nem conhece as suas lutas e sobrevivências. Como virou moda chique morar em Portugal muitxs brasileirxs nem se dão ao trabalho de saber e conhecer para onde vão e tentam atingir "o elo mais fraco". Aquele é somente um trabalho e a decisão de substituição é delicada, mas ao mesmo tempo humilde e corajosa embora seja questionável ser se subserviente a uma violência simbólica e autoritária desse teor. A comunidade LGBTQ+ que se una ainda mais e crie parcerias saudáveis com quem não é LGBTQ+. Não somos obrigadxs a ser humilhadxs principalmente quando somos solidários à causa. Bom senso e sensibilidade é transversal aos gêneros e exercita-se. A minha solidariedade para com o ACTOR, OPERÁRIO DA ARTE André. Patricio." 


A Piu

Campinas SP 27/01/2023

quinta-feira, 26 de janeiro de 2023

ONDE COMEÇA A MINHA LIBERDADE E ACABA A DO OUTRE? - série: sorria! você está sendo imaginado!


 Eis-me aqui na cidade de Évora, um dos berços da minha formação como actriz ou atriz ou atroz. Estamos no ano da graça do senhor de 2000 e este espetáculo " El Cubo" é de minha autoria e investimento financeiro, eu tirei do meu bolso para pagar a direção do Juan Ramon Urtera. Pois, de vez em quando para continuarmos o trabalho que para nós faz sentido fazemos dessas coisas. Mesmo assim prefiro pagar o meu trabalho do que ser desvalorizada e explorada por terceiros ou participar de trabalhos do quais eu não acredito que no rol vem as telenovelas ou determinadas abordagens teatrais que considero obsoletas  com todo o respeito por quem as exerce. São escolhas e todas elas teem um preço.

Este personagem, como muitos tantos, que tenho interpretado desde o inicio da minha trajetória artistica e profissional que remete ao inicio dos anos 90 é andrógino. Isto é, um personagens que apresenta caracteristicas, traços ou comportamentos que transitam em que é considerado feminino ou masculino. Algo indefinido entre esses dois conceitos. Na vida do dia a dia também sou, de certo modo assim embora até ao momento me considere uma mulher cisgénero heterosexual. Isso não me faz nem mais nem menos que outras pessoas com outras orientações sexuais. Como teatreia sempre tive colegas e amigos de distintas orientações. Aliás, o meu grande amigo de infância na escola era o Pedro, um menino efeminado com humor que quase ninguém nos segurava na risota durante as aulas até sermos separados. Cresci entre rapazes, sendo a única menina da família e da meninasa que brincava na rua naqueles finais de anos 70 e inicio de 80 num Portugal já democrático onde algumas meninas, como eu, não tinham as orelhas furadas à nascenças nem usavamso lacinhos e folhinhos e sim roupa unisex ou vestidos e saias para rodar e rodar e rodar com a inocencia de sermos crianças e não objeto de desejo de adultos de mente adoecida.

Durante os ensaios deste trabalho eu engarvidei e cheguei a apresentar grávida, quando a barrigota era discreta. Construi este personagem, que é uma moradora de rua com os seus sonhos e delirios poéticos e desejos de consumo e conforto que lhe é negado. Eu nunca morei na rua, embora já tenha dormido na rua nessas viagens de mochilão por cidades da Europa do Leste, assim como pelas praias da Andaluzia no sul da Espanha. Ser roots não é o mesmo que ser morador de rua, vamos combinar. Assim como ter um lado androgino não me faz negar o facto de ser mulher. Por ser atriz, e ter investido nessa formação eu considero que tenho a liberdade de interpretar toda e qualquer personagem, obviamente sem apropriações. Eu não vou pintar o rosto de negro para fazer de negra. São principios éticos. Também não me  vou fingir de homesexual no dia a dia para ser aceite por determinada comunidade ou por que acho que é moderno. Justamente por respeitar quem tem outras orientações.

Bom, no próximo texto escreverei sobre um ocorrido polémico duma atriz trans brasileira que invadiu um palco duma peça de teatro em cena em Lisboa chamando um ator de transfake e mandando-o sair do palco. Enfim, parece que se instalou a prática de se invadir e desrespeitar a democracia, os artistas trabalhadores e suas obras, neste caso por uma causa que considero nobre que é a LGBTQ+. Como cantava o querido conterrâneo Sérgio Godinho: " O fascismo é uma minhoca que se infiltra na maçã ou vem com botas cardadas ou com pezinhos de lã."

A Piu

Campinas SP 26/01/2023

terça-feira, 24 de janeiro de 2023

BONITO SER VICIO! - série: sorria! você está sendo imaginado!



Era a terceira ocasião naquela área de evacuação de necessidades fisiológicas. Hmmm que definição tão pomposa para banheiro, casa de banho, quarto de banho, WC, toiletes, servicios. Sim, em espanhuelo fala-se: servicios. Faz sentido. A pessoa coloca-se ao serviçoa das necessidades fisiológicas. Quem não as tem? Desde o ser mais glamorouso ao autoritário com aparencia de invencivel. Aproveito, em nota de esclarecimento, dizer aqui que quando escrevo no post anterior que " Para mim as redes sociais, como tudo na vida, é para estar ao nosso serviço e não o contrário." Refiro-me a ferramentas, tais como tecnologia, dinheiro, bens materiais e não a seres humanos em especifico e seres vivos no geral. Para mim cada vez se torna mais nitido, principalmente vivendo há 11 anos no Brasil, que eu não vim aqui para ter criados nem ser criada de ninguém, seja no Brasil ou em qualquer parte do mundo. Estarmos ao serviço dos outros, da vida, do bem comum não é o mesmo que ser serviçal. Já ter um carro dá jeito mas precisamos de ter tantos carros a deambular por este planeta? Ter dinheiro para mim é um meio e não um fim. Quando nos movemos somente por dinheiro algo de muito valioso se perde pelo caminho que no final das contas é a nossa alma e a conexão com tantas outras almas. Alma no sentido de psique, de integridade no propósito de vida não, me refiro às alminhas que transitam entre o céu, o limbo e o inferno.
Ali estou eu entre um vaso sanitário e uma porta toda escrevinhada. Essa prática de escrever nas portas, paredes e nas árvores lembra-me sempre a minha adolescencia. Nunca tive o hábito de escrever, mas curto ler o que vai na alma da pessoa cagona, mijona, menstruada, com vómitos. Há de tudo! Desde as declarações amorosas mais asolapadas, erotismo, vulgaridade, a poesia, filosofia, panfletarismo quando descobrem o Marx e o Trotsky, baboseiras várias. Vá lá freguês! Quer que embrulhe ou vai comer já!
Quando vi estes escritos, já faz umas boas semanas, fiquei a pensar quem teria escrito essa de que era mais fácil parir, mesmo que o bebê saia rasgado, do que aquela pessoa cagar. Ooops defecar. Seria uma mulher cinica e ressabiada com a vida que desprezava quem paria. De onde ela teria nascido? Que relação ela tinha com o seu corpo e com a sua mãe? Um homem? Mas aquele banheiro é feminino, mesmo sendo um espaço cultural onde eu já fiz uma audição para teatro, onde aconteceu uma parte dpo encontro de mulheres palhaças e nesta ocasião um festival de dança, danças à deriva onde o mote é a inclusão. Ou seja, um lugar no centro de São Paulo onde transitam artistas e pessoas ligadas à arte ou que a apreciam. Teria sido uma lésbica? Alguém bissexual, transgénero, queer, intersexual, assexual, pansexual? Era importante saber quem escreveu algo tão misógino e que teve a resposta à àltura: " Você odeia mulheres e mães e usa a metáfora gasta e bolsonarista do cu, gatam? VÁ FAZER TERAPIA."
De facto, este tipo de postura perante as mulheres num banheiro público demonstra que nem toda a gente está preparada para o fim da distinção de banheiros feminos e masculinos. Da minha parte eu quero estar tranquila e sentir-me segura na hora dos servicios. Não expor as mulheres a misoginos e tarados uma vez mais é o minimo que se pede. Ter outra orientação sexual e de génerro fora do cis não concede às pessoas o direito de serem agressivas e ainda acharem que estão muito à frente, que são modernas. Sim, tem essa. Por vezes fico na dúvida se a causa queer para alguns ser viventes, principalmente homens ou vindos desse género que depois mudam ou não, não é uma moda que subscreve o falocentrismo, a soberania do homem sobre a mulher reproduzindo uma caricatura do feminino e desprezando o feminino por consequencia. Para sermos respeitades e que sejam solidáries connosco temos que retribuir na nesma moeda se não é mais do mesmo da MERDA DO PATRIARCADO que os mesmes são vitimas mas retroalimentam. E isso é um (des)ser vicio e não quebra com o ciclo vicioso.
Desculpe, está na fila? Tem papel higiénico?
A Piu
24/-1/2023

sábado, 21 de janeiro de 2023

OS TAIS MINUTOS DE FAMA NA ERA DA INTERNET- série: sorria! você está sendo imaginado!


Onde é que eu estou, ãh? Quem adivinhar ganha uma caneta bic com tinta permanente. Por falar nisso! Quem é que ainda se dá ao trabalho de escrever à mão na era do digital onde tudo se registra, desde o prato de comida aquele bejinho maroto na gatinha ou no gatinho que se acabou de conhecer numa qualquer aglomeração pós confinamento? Aí a pessoa vai colocando um monte de informação acerca da sua vida privada mas que num estalinho de dedos pode-se tornar efêmera e a mesma precisa de se justificar diante dela mesma e da plateia quando três meses antes estava numa relação sólida e super amor da vida dela e de repente ou quase de repente, a coisa não corre assim tão happy end porque afinal se estamos vivxs não há happy endes e sim caminhadas, construções, desconstruções de (auto) relacionamentos. Amadurecimentos para quem se propõe a isso.

Para mim as redes sociais, como tudo na vida, é para estar ao nosso serviço e não o contrário. Sermos tomadxs pela super exposição que alimenta somente o ego e o voyerismo é como nos propormos ao jogo do Big Brother só que virtualmente e numa escala aparentemente menor, muitas vezes sem ter a verdadeira noção do impacto que é expor alguém ou nos expor quando provavelmente a base não é sólida,porque quando é sólida não precisamos de anunciar ao mundo que fazemos e acontecemos com determinada(s) pessoa(s). Simplesmente vivemos, apreciamos a convivência sem fazermos da nossa vida uma noticia da revista Caras. Um alarde constante para solicitar curtidas, likes. Obviamente que isto é uma opinião. Cada pessoa vive do jeito que quer e usa as redes sociais do jeito que bem entender desde que não prejudique terceiros. Seja vaidosa das suas conquistas desde que não aja com precoinceito e desdém com os demais. Anuncie que agora esá na Europa mesmo que seja um cantinho de Portugal esquecido chamado Cagarelhos de Baixo ou na India num retiro espiritual, mesmo que a sociedade indiana seja fortemente marcada por castas e duma desigualdade social constrangedora perante tanta espiritualidade turistica namaste gourmet. Sim, é um provocação porém nada que não traga no coração há muito. Onde há ego inflado e desigualdade social onde é que reside a revolução social e a espiritualidade libertadora?

Para os curiosos: estou no MASP, Museu de Arte de São Paulo, numa terça em que é gratuito para o povão e é lindo testemunhar vários visitantes de cores e feitios fazerem fila para entrar e onde poderão apreciar obras nomeadamente do Portinari ao invés de esfaqueá-las como os fascistazinhos que nem nos EUA são bem vindos depois do que fizeram no Planato Central. Como é lindo o mundo, mesmo assim, baixar a bola a esses criminozinhos birrentos que desrespeitam a sua própria Constituição e manifestam a sua boçalidade na plenitude. O que aconteceu em 8 de janeiro de 2023 em Brasilia é uma canetada a tinta permanente que depois dessa sermos éticos uns com os outros além dum direito é um dever.

A Piu

Brasil, 21/01/2023